Curitiba, PR – Apesar de um início de 2025 que tem mostrado um certo crescimento nas vendas e na produção de veículos, o setor automotivo brasileiro vive um momento de grande apreensão devido à persistente falta de previsibilidade em relação a questões-chave para o seu futuro. A indústria, que demanda investimentos de longo prazo, sente a ausência de um horizonte claro em políticas públicas e cenários econômicos, o que pode frear o ímpeto de recuperação e afastar novos investimentos.
A principal fonte de preocupação reside na demora e na falta de clareza na regulamentação do Programa de Mobilidade Verde e Inovação (Mover). Sancionado em junho de 2024, o Mover é fundamental para direcionar a eletrificação da frota e os investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) no país. No entanto, em meados de 2025, pontos cruciais como a definição do “IPI Verde” (incentivos fiscais baseados na eficiência energética e emissões) e as alíquotas para veículos eletrificados ainda não foram totalmente detalhados.
Márcio de Lima Leite, presidente da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), tem sido uma voz ativa na defesa da previsibilidade. Ele aponta que, mesmo com a existência do Mover, os recursos regulamentados para P&D para todo o ano de 2025 já foram esgotados no primeiro trimestre, gerando incertezas para as fabricantes de autopeças e de veículos que planejam investimentos contínuos. A falta de regulamentação clara impacta o planejamento de longo prazo, essencial para um setor que projeta seus produtos e linhas de produção com anos de antecedência.
Pressão das Tarifas e Concorrência Externa
Além das incertezas regulatórias domésticas, o setor enfrenta pressões externas que adicionam camadas de imprevisibilidade. A possibilidade de imposição de tarifas de importação mais elevadas pelos Estados Unidos sobre veículos e autopeças (como a proposta de 25% de tarifa adicional) preocupa as montadoras e fornecedores brasileiros. Essa medida pode deslocar investimentos e produções para países com acordos comerciais mais vantajosos com os EUA, como o México, impactando as exportações e a capacidade de investimento no Brasil.
A crescente importação de veículos, especialmente da China, também gera debates. Embora contribua para o aumento das vendas gerais, a Anfavea tem alertado para a “perigosa distorção” que a taxação inferior desses produtos pode causar, afetando a competitividade da produção nacional e a escala das fábricas instaladas no Brasil.
Impacto da Selic e Cenário Econômico
O cenário econômico interno, com a Taxa Selic em patamares elevados, também contribui para a imprevisibilidade. Juros altos encarecem o crédito ao consumidor e para as empresas, afetando diretamente a capacidade de financiamento de veículos e os investimentos em capital. Embora o mercado total de veículos mostre um crescimento em 2025, o varejo tem sentido uma retração no tíquete médio dos financiamentos, sinalizando a dificuldade do consumidor em arcar com custos mais altos.
Para o setor automotivo, a previsibilidade é a base para o investimento, a inovação e a geração de empregos. A falta dela força as empresas a operar com margens de segurança maiores e a adiar decisões estratégicas, o que pode comprometer o potencial de crescimento e a competitividade do Brasil no cenário automotivo global. A expectativa da indústria é que as autoridades atuem para prover a clareza e a estabilidade necessárias para o planejamento de longo prazo.